quarta-feira, 2 de maio de 2018

UTILIZANDO A HISTÓRIA ORAL

Diário de Campo: 05 de março de 2017.
A data da Pesquisa de Campo em Cachoeira se aproxima, mas antes de fazer algumas considerações sobre a Irmandade da Boa Morte, pensei em relatar um pouco sobre a metodologia e as formas de abordagem do tema. Por se tratar de um objeto tão subjetivo quanto a perspectiva da Morte em dois grupos sociais tão distintos e profundamente significativos como o Cinzento e a Irmandade, me cerquei de algumas referências importantes. 
Para o projeto sigo orientações de vários autores que se dedicam ao trabalho com fontes de História Oral, uma vez que esta abordagem permite construir um discurso de interpretação histórica mais completo, incorporando novos sujeitos, ampliando as possibilidades de pesquisa para além das tradicionais fontes escritas. Metodologicamente, se alicerça num conjunto de referências estruturadas a partir de entrevistas que compõem o marco de trabalho para a interpretação dos imaginários da Morte, dos seus rituais e das questões de comportamento, visões de mundo e práticas que os contornam.
Segundo Philippe Joutard, o maior mérito da história oral "é dar voz àqueles que normalmente não a têm: os esquecidos, os excluídos ou, retomando a bela expressão de um pioneiro da história oral, Nuno Revelli, os 'derrotados'", e principalmente ter aberta a visão de que cada indivíduo é ator da história, que fornece outras perspectivas interpretativas de mundo, porque “tudo o que é humano é nosso, e é preciso fazer recuar as fronteiras" (JOUTARD, 2000, p. 33). Essa preocupação, nos termos dessa pesquisa, é fundamental, por tratar da perspectiva de uma comunidade quilombola, cujas tradições são, comumente, alvo de preconceito, e para o qual, como diria, Gayatri Spivak (2010), é necessário perguntar se, de fato, pode o subalterno falar.
A principal categoria abordada durante o processo – e que permeia todo o projeto – é a memória. Como pesquisador, tomo a(s) memória(s) dos entrevistados alicerçadas em duas características: a primeira, como um processo seletivo, compreendendo que a memória que um grupo constrói está intimamente ligada com as suas vivências e o próprio grupo seleciona o que julga digno de comemoração/ monumentos ou não, ou lugares de memória, conceito de Pierre Nora. E, portanto, nem tudo fica gravado, registrado. O que se esquece ou o que se lembra é reforçado pela noção de pertencimento afetivo ao grupo, gerando um sentimento de continuidade, fazendo com que, coletivamente, a memória permaneça. Em segundo lugar, o entendimento de que a memória é construção. A memória individual tem, portanto, suportes muito presentes do seu grupo social. Essa memória é uma constante reconstrução do passado e é composta, segundo Pollak (1989), de acontecimentos, personagens e lugares, a interação dessas memórias individuais e coletivas ganham destaque nesta mesma coletividade, incorporando-se as narrativas que compõe a identidade do grupo.
Portanto, nesta etapa, cabe aos procedimentos da pesquisa, tentar alcançar por meio de registros de aúdio e de imagens, um recorte temático sobre a perspectiva da morte entre membros da Irmandade da Boa Morte e comunidade quilombola do Cinzento, levando em consideração as respectivas particularidades, bem como me respaldar em bibliografias pertinentes, e entrevistar também pessoas que estudam os dois grupos, têm contato próximo, para que, à medida que a pesquisa avance, seja possível aprofundar o estudo.

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